domingo, 25 de abril de 2010

CADA CARA

As óbvias perguntas são como as tiranias dos fatos. O duelo da doce vontade de fortificar a personalidade contra a dureza de tocar os dias, as contas, as dores. No princípio, o precipício atraía e trazia verbos de imprevisibilidades. No meio, cada dia-a-dia era o precipício e, em cada rosto, um fantasma que quer agarrar e torturar.

Os ossos estão formados. A expressão no rosto esconde o coração que caminha pro enfarto. Você já sabe como ter o pão, o leite, o "gim das crianças". Anda, se defende, e em algum tempo já se volta contra o chão, colchão de espuma e solidão. Pensa, não corta os pulsos, mas hesita em viver. Está no meio, no meio da vontade, metade do desejo. Quer esmurrar a parede, as espumas são piores que as amarras - esses carbonos loucos. Ninguém lhe ouve, paredes de espumas.

Nenhum corpo cai naquela noite, daquele prédio. Pra aquele homem, as estrelas quando caem não tem mais força poética. As estrelas no céu, quando tem força poética? Não pensa, age, é quase patético e vai se vestir. Vai à benção todos os dias, ao Senhor Deus do Trabalho. Ovelha pálida. Não seria justo dizer seu nome, sua raça, em qualquer lugar você é o mesmo, com seus medos. Você é 30 bilhões de pessoas. E quando do precipício não ecoa mais surpresas, o fantasma é cada cara, é o começo, o começo do fim.

Gardenia Dultra, setembro 1998.

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