quinta-feira, 22 de março de 2012

não seria demais eu esperar de todas as noites sangrentas algum deleite que alcançasse meu corpo sem cobrar de mim os excessos que cometi. flores não abrigos disfarçados de glórias, são expectativas vãs de viver em antigos confortos, são ilusões de paisagens vis. pra cantar em um baile que ainda sonho estar - sem oprimir, sem ser oprimida - por que tenho que fugir sempre? seria demais eu tocar os dias com a intensidade que meu corpo precisa? Ah, justificativas vãs, pedem sempre punições cruéis - e o mundo dá! como a obviedade da matemática racionalista, seus princípios, meios e fins. ah, ação e reação e a sua linguagem jurídica. a imputação, o vermelho, o negro, como a máquina contábil que a cidade nos detém, nos condena a pagar infindáveis impostos. qual o rosto surgirá em nós plantado pelos dias, pelas horas, pelos projetos adiados? Por que negar que ainda está lá aquela criança que sorri amarelo quando tens que flertar os tais sapos do jantar? Quisera meu medos fossem irreais, quimeras a ser sanadas com algum fármaco, um cloridrato qualquer.

sábado, 17 de março de 2012

quanto custa a nossa atenção? o valor dos nossos olhos pode ter o preço da nossa perdição, o desvalor dos nossos olhos pode supervalorizar a nossa opressão. Quais sinais estarão agora postos como setas de possíveis caminhos? O flaneur foi subornado por antigas contas do padrão, pelo desejo do patrão de domesticar potros, perdeu a manha de não despertar a fúria da vigilância e punição. Ele agora é vigiado a ser banido tal um componente indesejado do que caiu no chão. Esta metrópole do Nordeste não convida a nela banhar-se com os olhos desejantes de novas paisagens. O velho vai cristalizando rotas de fuga da visão, impelindo a cabisbaixar e a curvar-nos sobre o excesso de tudo o que é considerado lixo. A curvatura proíbe o olhar, a curvatura vitimiza,a ver os usuários do crack estrutural das cidades maniacamente catando, buscando pelo chão promessas e perspectivas de aplacar a fissura. Buscar não como meio de estruturar caminhos, buscar como mineradores cavando galerias subterrâneas a procura do que escolheram como pedra preciosa. A pedra de eleição. Quando digo "excesso de tudo que é considerado lixo" comento sim uma redundância - o lixo é o que excedeu, o que não serviu ao processo, à produção.

A doença provocada pelo crack estrutural da cidade é, dentre tantas outras, a própria epidemia do crack. A epidemia do crack é uma doença do olhar, de como olhamos a cidade, o coletivo. A doença do crack é um sintoma da negação do olhar, digo o olhar como experiência e diálogo com o que nos é diferente, externo e excêntrico.